Neste 12 de outubro, Dia da Criança, o Conselho Federal de Odontologia (CFO), apresenta a entrevista com Luiz Evaristo Volpato, especialista em Odontopediatria há mais de vinte anos e atual Tesoureiro do CFO. Em entrevista, Luiz Evaristo Volpato evidencia a importância dos cuidados essenciais com a saúde bucal na infância neste período de mudança de hábito gerada pela pandemia. A proposta é destacar os cuidados como forma de prevenção de doenças, à exemplo da cárie dentária, que é a principal doença bucal na infância. Além de Odontopediatra, Luiz Evaristo Volpato é mestre em Saúde e Ambiente, especialista em Saúde Pública e professor na Universidade de Cuiabá.
- Quais os problemas bucais mais recorrentes na infância?
A principal doença bucal na infância é a cárie dentária, que é causada pela inter-relação de vários fatores, dentre eles fatores diretamente relacionados com a ocorrência da doença como a ingestão de açúcar e a higiene bucal inadequada e fatores que, apesar de não estarem relacionados diretamente com a etiologia da cárie, influenciam em sua incidência e prevalência, como a renda, o comportamento e nível de instrução. Pode-se dizer que a cárie dentária possui total influência dos hábitos da criança.
Além disso, existem os fatores chamados de confusão ou fatores secundários, que são aqueles que não impactam diretamente da etiologia (causa da cárie), como a renda, o comportamento, ou o nível educacional, mas interferem muito na ocorrência da cárie dentária. É possível dizer que a cárie possui total influência na questão dos hábitos da criança.
- Com a mudança de hábito das crianças na pandemia, quais os cuidados essenciais com a saúde bucal?
Sabe-se que os hábitos foram totalmente modificados pela pandemia e pelas restrições impostas nesse período, principalmente às crianças. Com maior tempo de permanência em casa, também aumenta drasticamente o tempo de acesso à comida e não necessariamente ocorre a escovação dos dentes a cada refeição ou consumo de alimentos fora do horário tradicional.
Além disso, muita gente acaba dando maior atenção à escovação dos dentes quando vai sair de casa e, ao permanecer em casa, acaba reduzindo as vezes que higieniza os dentes. O aumentando da frequência do consumo de alimentos associado à redução da higiene bucal acaba favorecendo o desenvolvimento da cárie. Nesse contexto, cabe destacar que a cárie está mais relacionada com a frequência de consumo de açúcar do que com a quantidade de açúcar que é ingerido. Ou seja, quanto mais vezes no dia a criança estiver consumindo alimentos que contém açúcar, maior vai ser a chance de ter cárie dentária. Existem indícios de que isso está acontecendo se considerarmos a quantidade de pessoas que engordaram durante a quarentena, muita gente engordou. A gente percebe que os hábitos realmente mudaram, inclusive hábitos alimentares e de higiene, o que eleva a chance do desenvolvimento da cárie.
- Como identificar e tratar o bruxismo na infância?
Outra alteração relacionada à saúde bucal que pode estar mais presente em função da pandemia é o apertamento e ranger de dentes, também conhecido como bruxismo, e as dores na articulação temporomandibular. À medida que a pessoa tem uma alteração tão drástica do seu estilo de vida, como crianças que habitualmente têm muita energia e brincam e correm na escola ou com colegas e amigos e, de repente, se veem confinados em suas casas ou apartamentos, isso acaba gerando um estresse, e muitas vezes esse estresse vai ser direcionado para ranger ou apertar os dentes. Crianças podem estar desenvolvendo mais dores de cabeça, mais desgaste nos dentes em função do estresse gerado nas mudanças no estilo de vida.
Para identificar é preciso prestar atenção se a criança está reclamando de dor de cabeça. Os pais, mães e familiares também precisam estar atentos para perceber se criança está apertando ou rangendo os dentes quando está dormindo, assistindo televisão, mexendo no celular ou tablet por exemplo.
O primeiro passo é identificar o que está deixando a criança ansiosa, tensa e tentar chegar na causa do problema. Muitas vezes, o bruxismo tem uma causa de fundo emocional, que está deixando a criança ansiosa, tensa e ela acaba rangendo os dentes em função disso. Não basta tratar somente a condição bucal, é preciso identificar os fatores e tentar controlá-los, isso pode ser feito em casa, mudando o estilo de vida ou com ajuda de outros profissionais, como cirurgiões-dentistas e psicólogos.
- É preciso higienizar a gengiva do bebê?
Durante um bom tempo se orientou sobre fazer a higienização bucal do bebê mesmo antes de nascer os primeiros dentinhos, utilizando técnicas específicas, mas hoje o entendimento que se tem é que isso não é necessário. Na verdade, dependendo da forma como é feita, pode até machucar a gengiva, então não é orientado fazer uma higienização sistemática da gengiva, por exemplo, passar gaze três vezes ao dia na boca do bebê pra deixar ela limpinha, não precisa.
Os pais e mães podem limpar a boca do bebê quando perceberem que é necessário, higienizar a gengiva ou a língua do bebê, mas sem ter essa sistematização. O que se sabe hoje, é que não há relação comprovada com a prevenção da cárie dentária, o importante é começar a fazer a higienização a partir do momento em que os dentes nascerem. Não há uma comprovação de que essa higiene prévia previna a cárie dentária.
É interessante lembrar que assim que nascer os primeiros dentes é importante escovar com pastas de dentes que contenham flúor e colocar pouca pasta na escova – o equivalente a um grão de arroz cru para as crianças bem pequenas.
- O uso da chupeta ou chupar dedo podem influenciar na dentição?
O hábito de chupar o dedo ou a chupeta pode influenciar na dentição sim. Mas isso dependerá de uma série de variáveis como: quanto tempo a criança faz a sucção durante o dia e durante a noite; qual a intensidade que ele faz a sucção do dedo ou chupeta; até que idade ele permaneceu com o hábito; além de características relacionadas ao tipo facial de cada criança também.
O ideal é que a criança não tenha o hábito de sugar o dedo ou a chupeta – o que acontece com mais frequência em crianças com aleitamento natural. Caso a criança já tenha o hábito instalado, é importante buscar reduzir o tempo da sucção durante o dia e noite e a remoção do hábito preferencialmente até os dois anos de idade.
- Quando iniciar o uso do fio dental na infância?
O ideal é iniciar o uso do fio dental no momento em que se tem um dente encostado em outro dente. É importante não deixar pra passar o fio dental quando a criança está maior e sim quando um dente já estiver encostado em outro.
- Qual o intervalo ideal de consulta ao Cirurgião-Dentista especialista?
Uma criança que tem hábitos propícios ao desenvolvimento da cárie dentária, certamente o Cirurgião-Dentista pode melhor orientar para que tenha a mudança desses hábitos, acompanhando assim, mais de perto o paciente, com frequência maior e com intervalo menor entre consultas para trabalhar de forma preventiva. A criança que está com a cárie controlada pode ter um espaçamento maior entre as consultas com o Cirurgião-Dentista, de uma forma geral, entre 1 e 6 meses. Esse tempo será determinado pelo próprio Cirurgião-Dentista, a partir da situação apresentada pela criança e pela família.
De maneira geral, é importante que a mãe, antes de ter o bebê seja consultada pelo profissional Cirurgião-Dentista ou por um Odontopediatra, que é o especialista no atendimento de criança, para realizar o pré-natal odontológico, que consiste na consulta ao Cirurgião-Dentista para receber importantes orientações que irão preparar os pais para cuidar melhor da saúde bucal e saúde geral do bebê que vai nascer. O dentista vai orientar sobre o aleitamento materno, a higiene dos dentes, as possíveis alterações que podem acontecer na criança na época em que estiver nascendo os dentes, dentre outras orientações, deixando assim, a mãe mais preparada.
Na sequência, depois que o bebe nascer, também é importante que a mãe ou pai volte ao consultório odontológico para apresentar dúvidas e dificuldades que possam surgir nos cuidados da criança. O Cirurgião-Dentista também pode orientar, no caso do uso da mamadeira, qual o bico mais adequado, se for uma criança que já usa chupeta, qual a chupeta mais adequada. Orientar em relação à cronologia e sequência de irrupção dos dentes, quais os dentes nascem primeiro, quais os cuidados que devem ter e, depois, retornar novamente ao Cirurgião-Dentista, a partir do momento que os dentes estiverem nascido. Com o foco individualizado, conforme a rotina da mãe, a frequência ao consultório vai depender de criança para criança, de acordo com o risco de desenvolvimento de alguma doença que o Cirurgião-Dentista pode identificar nas consultas.
Por Michelle Calazans e Camila Melo, Ascom CFO.
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